Sequência Didática – Preconceito Racial

DESCONSTRUINDO OS ESTEREÓTIPOS EM SALA DE AULA 

Autoras:

Daynara Lorena Aragão Cortês

Iasmim Santos Ferreira

Amparo teórico e fundamentação da sequência didática:

Conforme Rildo Cosson (2011) assegura, a literatura é “uma experiência a ser realizada […] ela é incorporação do outro em mim sem renúncia da minha própria identidade” (p. 17). Permeado por essa visão, consideramos o trabalho com a literatura um exercício instrutivo que possibilita a viagem interna através de novas experiências de leitura. A aquisição de novos conhecimentos e a revisitação do “eu” é garantida, quando o sujeito permite tornar palpável o que partiu do real, consciente que esse universo pertence ao plano da ficção. Em diferentes idades, a arte, de modo geral, é essencial e, além da sua função estética, ela desempenha diversos papeis, cuja realização depende da subjetividade de quem a utiliza.

Ainda referente às considerações do especialista na área da educação, o trabalho com a literatura, ou seja, a literatura escolarizada, por muitas vezes, tende a associar esse gênero artístico como sendo um elemento complementar à história. O que, por sua vez, acaba sendo um largo problema, pois a sua apresentação bloqueia a liberdade e humanização que a literatura permite realizar (CANDIDO, 2011). Pensando nisso e na contribuição da promoção de um ensino ligado ao trabalho com a literatura através do incentivo à leitura, a presente Sequência Didática (SD) tem por objetivo central conceder a experiência da criança em tomar às formas de uma personagem negra vítima da segregação racial.

Desse modo, as discussões geradas em torno das questões étnicorraciais, exigidas pela aplicação da lei 10.639/03, fazem-se presentes e possibilitam, sobretudo, o trabalho com a linguagem. Neste aspecto, vale trazer à tona a seguinte visão:

Uma das funções sociais da linguagem é servir de relação entre o que ocorre em todos os campos do conhecimento. Trabalhar a linguagem nessa dinâmica é promover uma literatura ativa, que não se reduz a quaisquer esquemáticos. O trabalho com a linguagem torna-se assim simétrico à função social da literatura: promover a transformação da realidade, qual é parte constitutiva. (ABDALA JR e PASCHOALIN, 1990, p. 161).

Consciente da função social da literatura e do trabalho operativo com a linguagem, o ensino da diversidade étnica, a descentralização da visão europeia e, por fim, a desconstrução das imagens estereotipadas da população negra no imaginário coletivo, deve ser feita de modo que o (a) professor (a) privilegie a interpretação e socialização dos saberes (MUNANGA, 2005). Feito isso, além de tornar o ensino mais atrativo, a função humanizadora da arte influi na formação dos sujeitos e possibilita-os viver novas experiências nas aulas de Língua Portuguesa. Em vista disso, a SD teve como amparo as orientações de Cosson, na adaptação da sequência básica proposta em seu livro: Letramento literário: teoria e prática (2011); através do trabalho com o conto “Negrinha”, do escritor brasileiro Monteiro Lobato.

SEQUÊNCIA DIDÁTICA 

Público alvo: 6º e 7º ano do ensino básico.

Número de aulas:  sete aulas de 50 mim.

1. Motivação:

1º Aula:

De acordo com a abordagem de Cosson (2011), intermeado pelas fases propostas pelo estudioso – 1º motivação, 2º introdução, 3º leitura e 4º interpretação –; o preparo do (a) aluno (a) para recepcionar a leitura e interpretação textual do conto “Negrinha”, de Monteiro Lobato, será feita através de um questionário. Este tem como objetivo sondar a imagem social construída em torno das representações da negritude, por meio de situações comuns. É importante que o (a) professor (a), nesse momento inicial, apresente-o, de preferência, em projeção para que todos possam ver a imagens.

Materiais: 

  • Computador e datashow, de preferência, para que seja exibido de modo mais amplo;
  • Questionário disponibilizado em anexo neste material.

Objetivos: 

  • A partir das representações das diferentes etnias postas no questionário, sondar a imagem construída socialmente na mente das crianças;
  • Fazer um trabalho lúdico que revele a aproximação ou distanciamento das crianças em relação às imagens;
  • Trabalhar a argumentação dos (as) alunos (as).

Dica: 

Como o trabalho busca sondar a argumentação do (a) aluno (a), uma vez exigida a justificativa de escolha da imagem, peça que o (a) aluno (a) se expresse de modo que todos possam ouvir. Aguce a curiosidade em saber os motivos que os (as) levaram a escolher determinada personagem e, após isso, busque interagir, pois, nesse momento, podemos identificar possíveis dificuldades de posicionamento em face dos (as) colegas. Por fim, caso considere necessário, coloque-os (as) em círculo para que haja um estreitamento de laços afetivos entre eles (as).

1º Anexo:

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2. Introdução:

2º e 3º Aula:

De acordo com as respostas obtidas na aula anterior, direcione a discussão de forma que desconstrua o direcionamento da negritude ligada ao sentido pejorativo ou maléfico. Depois disso, nas duas aulas, reserve uma parte do tempo para exibir o vídeo “#EP07 – EMPODERADAS [MC SOFFIA]”, presente no canal: Empoderadas, no site: <youtube.com>. Nesse material, a jovem artista e cantora narra a sua história e discorre sobre a falta de representatividade positiva negra. Possivelmente, haverá identificação da maioria, por questões étnicas, de gênero e/ou pela faixa etária.

Referência do vídeo: <https://www.youtube.com/watch?v=yEk2-lolkaA&gt;.

Materiais:

  • Computador e datashow;
  • Caixa de som para exibição do vídeo em propagação nítida.

Objetivos:

  • Trabalho lúdico com projeção em vídeo;
  • Estimular a argumentação;
  • Conscientizar sobre a importância das representações étnicas.

Dica:

Pergunte se era de conhecimento da turma o trabalho da artista Mc. Sofia. Depois disso, busque, junto com os alunos, entender os motivos que levam a ocultar essa artista dos canais que atingem à massa. Como o trabalho com a linguagem feito pelos (as) rappers e mc’s segue uma linha de aversão aos problemas sociais, estimule nos (as) alunos (as) a discussão e peça que sejam elencados temas recorrentes na produção desses (as) cantores (as). Ex: desigualdades, como é o caso do racismo, machismo, drogas, entre outros. Sugerimos a visitação das composições dos rapper’s Criolo e Emicida.

3. Leitura:

4º aula:

Nessa quarta aula, leve o conto “Negrinha”, de Monteiro Lobato, impresso e em reprodução Power Point. Divida os (as) alunos (as) em pequenos grupos e direcione a leitura de modo que todos (as) possam participar. Nessa atividade, você poderá encontrar possíveis dificuldades de decodificação, esta entendida como a primeira fase da leitura. Por isso, observe bem e considere o respeito às pontuações do texto, principalmente, na entonação da voz e posicionamento nas partes em que a narrativa exibe o discurso direto.

Materiais:

  • Computador e datashow;
  • Diversos exemplares do conto impresso.

Objetivos:

  • Tornar conhecido a produção de Monteiro Lobato;
  • Trabalhar a literatura infanto-juvenil;
  • Propiciar um ambiente prazeroso para leitura.

Dica:

Organize-os em formato de pequenos círculos e faça com que todos (as) participem. Fique em movimento na sala, para que os (as) alunos (as) se sintam à vontade, sem a pressão de um avaliador (a) rígido (a). Para que a leitura aconteça espontaneamente, é importante a interação entre eles (as) com o (a) professor (a).

Obs.: o conto “Negrinha”, do escritor brasileiro Monteiro Lobato, pode ser encontrado no seguinte link: <http://www.bancodeescola.com/negrinha.htm&gt;.

4. Interpretação:

5º e 6º Aula: 

Na etapa final da SD proposta por Cosson (2011), a fase de interpretação corresponde a última. Nesta etapa, você estimulará a interpretação do texto feita pelos (as) alunos (as). Isso poderá ser feito, também, pela abordagem biográfica do autor do conto. Desse modo, o trabalho com a linguagem estará imbricado com a capacidade argumentativa, pois será preciso ser feito a rememoração das cenas e das personagens do conto lido na quarta aula. Por isso, evidencie cenas marcantes e deixe a liberdade expressiva preencher o tempo da aula. Provavelmente, cenas de preconceito racial servirá como argumento para ligar o texto ao cenário atual. Quando isso for feito, mostre o diálogo que há entre o que está representado e o quadro contemporâneo que todos nós estamos inseridos. Faça com que a discussão se estenda e reserve a sexta aula para programar a avaliação final desta sequência, através de uma peça teatral produzida pelos (as) alunos (as).

Materiais: 

Obs: Não será preciso nenhum utensílio nessas duas aulas.

Objetivos:

  • Estimular a argumentação;
  • Promover o reconto do conto através da linguagem oral;
  • Favorecer a socialização e o trabalho em grupo.

Dica:

Na sexta aula, deixe os (as) alunos (as) livres para articular caminhos da apresentação teatral. A sua intervenção deverá ser feita no momento de divisão das atividades, como é o exemplo da destinação de um (a) ou mais alunos (as) no ofício de ser o narrador, outros para personagens, etc. Ofereça dicas de cenário e roupas, mas busque manter a singularidade da turma, pois isso ajudará na promoção de uma maior autonomia.

7º Aula: 

Nesta sétima e última aula, apresente o resultado final a toda escola e comunidade familiar. Como apresentação inicial, compartilhe com os (as) seus (suas) colegas de magistério a importância das prerrogativas da lei 10.639/03, da interdisciplinaridade e aponte caminhos que poderão ser feitos em conjunto. Depois disso, mostre aos pais presentes o trabalho com a língua através da leitura e interpretação do conto “Negrinha”, de Monteiro Lobato, e, por fim, da elaboração da peça teatral.

Materiais:

  • Objetos da peça teatral escolhidos e levados pelos alunos;
  • Computador, datashow e caixa de som.

Objetivos:

  • Promover o encontro entre o ambiente escolar e a comunidade;
  • Estimular a criatividade dos (as) alunos (as);
  • Incentivar a criação artística;
  • Fomentar o empoderamento de meninas e meninos negros;
  • Despertar a importância do combate ao preconceito racial.

Dica:

Professor (a), você tem um discurso respeitado pela comunidade, por isso aproxime-se dos pais e, também, do corpo administrativo da escola. Enfatize a importância do trabalho e do combate ao preconceito racial. Aos (as) alunos (as), mostre-se presente. No encerramento dessa SD, você poderá convidar alguma figura ilustre da cidade, um senhor ou senhora mais velha, que possa relatar experiências de vida e uma visão mais madura acerca das desigualdades étnicas, cujo problema é histórico. Ao final, agradeça a oportunidade de tê-los (as) presentes e busque inserir a temática em outras aulas.

 

Referências

ABDALA JR, Beijamin & PASCHOALIN, Maria Aparecida. História social da literatura portuguesa. São Paulo: Ática, 1990.

BRASIL, Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília: MEC.

CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: ______. Vários escritos. 3º Ed. São Paulo: Duas Cidades, 1995, pp, 171-193.

COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. 2ª Ed.,1ª reimp. São Paulo: Contexto, 2011.

GOMES, Nilma Lino. Educação e relações sociais: refletindo sobre algumas estratégias de atuação. In: MUNANGA, Kabengele (org.). Superando o racismo na escola. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005, p 143 – 154.

MUNANGA, Kabengele (org.). Superando o racismo na escola. 2ª Ed. ver. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005.