O ENSINO DE CONTRADIÇÃO E ANTONÍMIA NO ENSINO MÉDIO A PARTIR DA MÚSICA “O QUERERES” DE CAETANO VELOSO

Autores: Drielly Santos de Jesus, Emili Lamonyer Oliveira de Carvalho, Jadson da Costa Rezende, Liliane Souza Silva, Marine Giohana dos Santos Farias, Vitória Soares de Andrade

Orientação: Profa. Marcia Regina Curado Pereira Mariano – UFS

Resumo: De um ponto de vista qualitativo-interpretativista, este artigo tem como finalidade mostrar a importância do entendimento da pragmática e da semântica e de dois dos seus conceitos (a antonímia e a contradição) para a compreensão das enunciações em seus diversos âmbitos. Como objeto de estudo, a música “O quereres”, do cantor e compositor Caetano Veloso. Após isso, desenvolvemos um plano de aula direcionado para discentes do Ensino Médio, inseridos na faixa etária de 15 a 17 anos. Levando em consideração a necessidade de conhecimento de mundo e complexidade do assunto, eles se enquadram perfeitamente no contexto. No mais, o presente artigo visa ainda ampliar os horizontes intelectuais desses alunos, partindo de uma leitura consciente, interpretativa e explicativa de uma composição. Tal abordagem nos permite ir além do que se é ouvido para, consequentemente, entrar nas nuances da letra da música. Além disso, torna possível a proposta de um plano de aula criativo, elevando o nível de conexão para com os alunos.

Palavras-chave: Contradição; Antonímia; Ensino médio; O Quereres; Caetano Veloso.

Abstract: From a qualitative-interpretivist point of view, this article aims to show the importance of understanding pragmatics and semantics and two of their concepts (antonymy and contradiction) for understanding enunciations in their different contexts. As an object of study, the song “O quereres”, by singer and composer Caetano Veloso. After that, we developed a class project, using high school students, aged 15 to 17, as student models. Taking into account the need for knowledge of the world and the complexity of the subject, they fit perfectly into the context. Furthermore, this article also aims to broaden the intellectual horizons of these students, starting from a conscious, interpretative and explanatory reading of a composition. This approach allows us to go beyond what is heard to, consequently, enter into the nuances of the song’s lyrics. Furthermore, it makes it possible to propose a creative lesson plan, increasing the level of connection with students.

Keywords: Contradiction; Antonymy; High school; O Quereres; Caetano Veloso.

INTRODUÇÃO

Nas diversas formas de comunicação social, é comumente notável que as contradições entre termos e sentenças estão presentes de forma espontânea nos hábitos linguísticos da sociedade. A estas relações de oposição entre frases e palavras atribuem-se, respectivamente, os nomes de contradição e antonímia. Dentre os motivos para tais ocorrências, podem ser apontados as heranças linguísticas passadas de geração para geração ou mesmo o uso proposital nas sentenças (ou entre elas) cujo intento seja o de elaborar uma linha de pensamento por meio das relações de oposição com a finalidade de expressá-la da forma mais lúcida possível.

Assim, por meio do estudo dessas modalidades, podemos demonstrar e analisar como funciona esse uso de forma mais clara e objetiva. Seguindo pelo campo da Linguística através da semântica, a contradição seria a oposição de sentido entre sentenças através da antonímia, mesmo elas tendo classificações distintas. Nesse sentido, este artigo tem como objetivo analisar, por meio da prática, os dois conceitos trabalhados neste texto e, na sequência, apresentar uma sugestão de metodologia para a apresentação deles na sala de aula para turmas do Ensino Médio. Visando ainda a dinamicidade no estudo do conteúdo e a demonstração de um exemplo de aplicação do conhecimento adquirido e, portanto, a sua importância, propomos o uso de uma música que envolva o conteúdo abordado a fim de ter, consequentemente, a interação e o envolvimento dos alunos na aula.

Partindo dessa premissa, fizemos, metodologicamente, na primeira seção, a conceituação da antonímia e da contradição, bem como uma contextualização de onde elas se inserem na Linguística. Posteriormente, na segunda seção, é apresentada a análise da música escolhida como exemplo de recurso didático, a saber, “O Quereres”, de Caetano Veloso, e, por fim, propomos uma sequência de etapas para que, à sua escolha, o(a) professor(a) possa seguir para trabalhar tais conceitos em aula de maneira eficiente.

Os principais autores utilizados foram Cançado (2008), Fiorin (2003) e Chomsky (1965). A partir deles, desfrutamos dos principais fatores significativos que encadearam informações fundamentais para o avanço do artigo. Dessa forma, vale ressaltar que a estrutura do artigo se dá a partir de uma divisão de três sessões que se inicia sobre o conceito de linguística, semântica, pragmática, contradição e antonímia, partindo para a análise da canção “O Quereres” de autoria do cantor e compositor Caetano veloso, concluindo, por fim, com a proposta de como usar o conteúdo na sala de aula.

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Apesar de não ser reconhecida como ciência à época, a Linguística foi uma das primeiras disciplinas a se concretizar como tal, no final do séc. XVIII. E não poderia ser diferente, pois ela estuda o principal meio de comunicação dos seres humanos, único ser que nasce com a capacidade da linguagem. Segundo Chomsky (1965), todos os seres humanos possuem uma gramática universal, inata, que é desenvolvida a partir do contato com uma língua. Assim, a Linguística trata-se da ciência que estuda a linguagem e suas manifestações em um certo período ou momento. Porém, focaremos, na exposição da semântica, área da Linguística voltada para o estudo do significado das sentenças e das palavras.

Como já foi dito, o ser humano tem uma capacidade inata para a linguagem, e, a partir disso, todos os falantes nativos de uma língua possuem intuições de como algumas propriedades das sentenças e das palavras se relacionam. Essas intuições são o conhecimento específico do falante e é esse saber linguístico que os semanticistas buscam descrever. Desse modo, segundo Márcia Cançado (2008), a Semântica é o estudo do significado das línguas e tem como foco o significado das palavras e das sentenças independente do contexto de uso. É importante salientar que a investigação linguística do significado se vincula com outros processos cognitivos. Esses processos são os fatores extralinguísticos, que fazem qualquer falante entender uma sentença além do que está expresso nas palavras. Fatores como conhecimento de mundo, entonação, expressões faciais, entre outros, são exemplos de aspectos extralinguísticos. Assim, “o sistema semântico tem o seu significado alterado por outros sistemas cognitivos para uma compreensão final do significado” (Cançado, 2008, p. 14).

Nesta perspectiva, entra a pragmática, que estuda o uso efetivo da língua. De acordo com Fiorin (2003, p. 161), “a pragmática é a ciência do uso linguístico, estuda as condições que governam a utilização da linguagem, a prática linguística, ou ainda, estuda a relação entre a estrutura da linguagem e seu uso”. Então, na busca pelos significados das sentenças e das palavras, é necessário um conjunto de conceitos que analisa especificamente os elementos dispostos nas sentenças ou fora delas de modo sistemático. Com base nisto, vamos nos aprofundar em um dos fenômenos semânticos, a contradição e na sua relação com os antônimos.

A contradição é a oposição de sentido entre, ou dentro, das sentenças, ou seja, uma contradição ocorre quando dois ou mais elementos da linguagem expressam significados incompatíveis ou conflitantes. Esta incompatibilidade pode ser expressada de várias maneiras, desde a negação total até inconsistências nas informações dentro de uma frase. Assim, “A sentença (a) é contraditória, quando (a) nunca puder ser verdadeira; ou quando não existir uma situação possível no mundo descrita por (a) (Cançado, 2008, p. 44)”. Compreender as contradições semânticas é essencial para decifrar como o significado é construído e como as pessoas interpretam informações conflitantes no texto ou na fala. Neste sentido, na análise da contradição é perceptível a sua ligação com os antônimos, que também tratam das oposições de sentido entre palavras, porém, vai um pouco além disso, pois nem todas as palavras exercem uma relação de oposição em relação à outra. Deste modo, são três os tipos de antônimos que são responsáveis por causar a contradição nas sentenças.

O primeiro tipo são os antônimos binários, que consistem em palavras de sentidos opostos, ou seja, a utilização de uma implica a impossibilidade de uso da outra, exemplo: João morreu, mas ele está vivo. É perceptível que essa construção frasal é contraditória, pois não é possível que uma pessoa esteja morta e viva ao mesmo tempo. Há os gradativos, que são “quando uma palavra está em terminais opostos numa escala em uma mesma sentença” (Cançado, 2008, p. 45). Exemplo: O prédio é alto e baixo. Assim, supõe-se que entre os níveis “alto” e “baixo”, há o nível intermediário. Os antônimos inversos, por sua vez, acontecem quando uma palavra representa uma parte da relação e a outra palavra a outra parte dessa relação. Então, as contradições são dadas com base nestes antônimos. Exemplos: Maria é sobrinha de Joana, mas Joana não é tia de Maria.

Apesar das relações de oposição geralmente se darem por meio de palavras antônimas, elas não necessariamente precisam acontecer dessa forma, por exemplo: Algumas pessoas amam morar nas cidades, outras odeiam. Essa construção é perfeitamente possível de ocorrer sem que haja a contradição. Porém, é preciso deixar claro que as contradições também ocorrem fora dos antônimos, através da negação de uma das propriedades semânticas, por exemplo, Carlos gosta de passear, mas ele nunca sai de casa. Essa é claramente uma sentença contraditória, pois não é possível alguém gostar de sair e não o fazer.

Ademais, a contradição também está ligada com a noção de acarretamento, “que é uma noção estritamente semântica, que se relaciona somente com o que está contida na sentença independente do uso” (Cançado, 2008, p. 25). A partir da noção de que uma sentença ‘a’ acarreta a verdade da sentença ‘b’, e que negando a segunda, ‘b’, fica contraditória a afirmação da primeira sentença, dizemos, automaticamente, que há o acarretamento. Então, vemos que há uma relação que é estabelecida entre a noção de acarretamento e a contradição.

Por fim, tendo em vista que a semântica estuda os significados da língua e que através de alguns fenômenos é possível identificar os sentidos presentes nas sentenças e nas palavras, escolhemos a canção “O Quereres”, de Caetano Emmanuel Viana Teles Veloso, disponibilizada no site Letras.mus.br, que foi construída com base nos fenômenos semânticos de contradição e antonímia, por entender que ela favorece a dinamicidade, elucidação e, portanto, a apreensão do conteúdo trabalhado, para, a partir dela, desenvolvermos uma análise mais profunda de como o compositor utilizou da semântica para a construção dessa bela poesia em forma de canção. Assim sendo, a interpretamos a partir do estudo das ocorrências de contradição e antonímia dadas, ressaltando como tal estudo auxilia no processo de compreensão da obra.

2. ANÁLISE DA MÚSICA

Como acabamos de ver, a relação de oposição pode se dar tanto pelo uso de antônimos binários, gradativos, inversos, quanto dentro do texto. No caso do exemplo aqui estabelecido, a relação de oposição entre os elementos da composição se dá predominantemente dentro dela mesmo, a ver.

Onde queres revólver, sou coqueiro

E onde queres dinheiro, sou paixão

Onde queres descanso, sou desejo

E onde sou só desejo, queres não

E onde não queres nada, nada falta

E onde voas bem alta, eu sou o chão

E onde pisas o chão, minha alma salta

E ganha liberdade na amplidão (grifos nossos)

Embora os termos destacados não sejam, isoladamente, antônimos, dentro da música a relação de antonímia é estabelecida, ao passo que tais palavras são colocadas em confronto entre si. Dessa forma, nos limitando antes ao primeiro verso, ao dizer que “Onde queres revólver, sou coqueiro”, Caetano nos transmite a mensagem de que onde a violência e o desassossego são desejados, seu eu-lírico é a tranquilidade, a paz – o oposto, portanto, daquilo que se quer. Cabe notar agora o uso da metáfora, dado que ‘revólver’ e ‘coqueiro’ representam, no contexto da música, os significados ou as noções de desassossego e tranquilidade, respectivamente, o que contribui para que o compositor consiga estabelecer eficientemente na canção as suas oposições.

Diante disso, vemos que o mesmo ocorre adiante e, portanto, temos que: onde há o interesse financeiro, materialista, ele é o sentimentalismo, a abstração – “E onde queres dinheiro, sou paixão” –; e, quando há o cansaço de uma outra pessoa numa interação sexual, ele permanece ativo – “Onde queres descanso, sou desejo” – ; quando um não quer nada, não existe a falta de nada – “E onde não queres nada, nada falta”; quando a segunda pessoa almeja ou idealiza muito, o eu-lírico é o realista, que mantém o pé no chão – “E onde voas bem alta, eu sou o chão”;o inverso disso no penúltimo verso e o último – “E onde pisas o chão, minha alma salta/ E ganha liberdade na amplidão” -, sugerindo que a liberdade e o crescimento acontecem quando a pessoa mencionada está em harmonia com os desejos da outra pessoa.

O refrão, por sua vez, também nos apresenta outro caso de contradição, ao passo que qualifica a flor como bruta.

Ah! Bruta flor do querer

Ah! Bruta flor, bruta flor

Mais uma vez pensando no uso da metáfora para fazer as contradições, a flor está, usualmente, associada, dentre outras, à noção de delicadeza. Além disso, nesse excerto, ela está seguramente também associada ao querer (“flor do querer”) a representando como algo que deveria ser delicado, mas que não o é, pois o eu-lírico adjetiva a flor como sendo bruta. Portanto, o amor ou paixão por ele referida não é acalentadora, delicada ou amena, mas sim, de maneira oposta, dolorosa, o que nos revela (além da exclamação “Ah!”) que os versos do refrão possuem caráter lamuriento.

No todo da composição, Caetano elabora um eu-lírico que descreve sua relação amorosa com uma segunda pessoa, revelando a desconexão ou o desencaixe que existe entre ambos, pois, enquanto a pessoa está de um lado ou de outro, ele representa sempre o oposto ou foge para o meio termo.

Onde queres família, sou maluco

E onde queres romântico, burguês

Onde queres Leblon, sou Pernambuco

E onde queres eunuco, garanhão

Onde queres o sim e o não, talvez

E onde vês, eu não vislumbro razão

Onde queres o lobo, eu sou o irmão

E onde queres cowboy, eu sou chinês (grifos nossos)

Há de se destacar, portanto, nesse fragmento a aparente ocorrência de um caso de antonímia gradativa, que, como já vimos, consiste na existência de uma relação de gradação entre os termos apresentados. Assim, a negação de um termo não implica necessariamente na afirmação do outro, pois essa afirmação pode recair ainda sobre um outro termo (Cançado, 2008, p. 46). No verso em destaque, contudo, não é o que temos; em vez disso, a aparente ocorrência desse fenômeno, já que o “sim” e o “não” seriam os termos extremos, mas há entre eles o “talvez”, que é o meio termo nessa escala gradativa. Com efeito, percebemos mais uma vez a contradição estabelecida por meio da metáfora, no sentido em que, enquanto um é decidido, o outro se mostra incerto.

Além disso, também merece destaque nessa estrofe que a oposição não se dá apenas entre o eu-lírico e o ser por ele amado, mas também entre ele e ele mesmo. Dessa forma, como visto anteriormente, quando se deseja o dinheiro (materialismo), ele é a paixão (sentimentalismo, abstração). Aqui, por outro lado, temos que, quando se deseja o sentimentalismo, ele é a representação do materialismo, o burguês, sendo, portanto, contraditório consigo mesmo. Assim sendo, notamos que a relação aqui não é mais a de antonímia, mas sim de contradição, porque a oposição se dá agora entre frases.

As mesmas relações se seguem também na terceira estrofe, onde o eu-lírico continua a falar da sua incompatibilidade com a segunda pessoa. A ver.

Onde queres o ato, eu sou o espírito

E onde queres ternura, eu sou tesão

Onde queres o livre, decassílabo

E onde buscas o anjo, sou mulher

Onde queres prazer, sou o que dói

E onde queres tortura, mansidão

Onde queres um lar, revolução

E onde queres bandido, sou herói

Diante disso, temos nos primeiros versos que, quando se quer a ação, o eu-lírico está ligado à espiritualidade; quando se quer o carinho, ele vai ser o desejo sexual; quando a liberdade for desejada, ele será o método regrado; em vez da pureza do anjo, a impureza da figura humana; quando a satisfação é desejada no quarto verso, ele é o sofrimento e a inversão disso na sentença seguinte; e, por fim, quando forem desejadas estabilidade ou a criminalidade, ele será respectivamente a instabilidade ou o heroísmo.

Assim sendo, nas estrofes adiante, é quando ele declara sua intenção de ficar junto do seu ser amado, quando ele assume que a relação entre eles é marcada pela dor e almeja encontrar a maneira possível para que eles fiquem juntos e felizes, e mostra mais uma vez as contraposições presentes na relação.

Eu queria querer-te amar o amor

Construir-nos dulcíssima prisão

Encontrar a mais justa adequação

Tudo métrica e rima e nunca a dor

Mas a vida é real e de viés

E vê só que cilada o amor me armou

Eu te quero e não queres como sou

Não te quero e não queres como és

Onde queres comício, flipper-vídeo

E onde queres romance, rock’n roll

Onde queres a lua, eu sou o sol

E onde a pura natura, o inseticídio

Onde queres mistério, eu sou a luz

E onde queres um canto, o mundo inteiro

Onde queres quaresma, Fevereiro

E onde queres coqueiro, eu sou obus

Já na última estrofe, é quando o eu-lírico assume suas contradições e inconstâncias.

O quereres e o estares sempre a fim

Do que em mim é de mim tão desigual

Faz-me querer-te bem, querer-te mal

Bem a ti, mal ao quereres assim

Infinitivamente pessoal

E eu querendo querer-te sem ter fim

E, querendo-te, aprender o total

Do querer que há e do que não há em mim (grifos nossos)

Ao falar que “O quereres e o estares sempre a fim / Do que em mim é de mim tão desigual”, o eu-lírico evidencia sua condição dado que, neste excerto, é ao seu querer que ele se refere e adjetiva (como “desigual”). Assim, percebemos que ele tem consciência de como é e, mesmo sendo tão controverso, e querendo ora bem, ora mal à segunda pessoa, deseja adquirir o autoconhecimento e “aprender o total do querer que há e do que não há” nele.

Assim sendo, a composição trata, sumariamente, da dissociação entre esses sujeitos e do eu-lírico consigo mesmo, que reconhece suas contradições e, por reconhecer isso e desejar infinitamente a segunda pessoa, resolve que o autoconhecimento o auxiliará na conciliação das divergências entre eles. Outrossim, vemos como a análise das interpretações são potencializadas por meio do estudo das relações de contradição e antonímia, uma vez que, por meio do conhecimento delas, temos o esclarecimento do texto e, assim, verificamos que o eu-lírico criado por Caetano é um eu-lírico inconsistente, haja vista que ora é uma coisa, ora é outra.

3. PROPOSTA DE AULA

É importante destacar que essa proposta é voltada para o ensino médio, visto que demanda um conhecimento maior sobre temas específicos e conhecimento de mundo. Além disso, os alunos dessa faixa etária geralmente têm a capacidade de análise crítica mais desenvolvida, o que lhes permitirá explorar as contradições e antônimos de forma mais aprofundada. É adequada especialmente para aulas de língua portuguesa, literatura ou música. Assim, o objetivo dessa atividade pode ser (a) analisar como o uso de contradições e antônimos contribui para a construção de significados na música, (b) estimular a análise crítica e interpretação de textos e (c) promover a compreensão da poesia e da expressão artística na música popular brasileira.

No que diz respeito à sequência de etapas, propomos os seguintes passos: (1) uma introdução do conteúdo no qual: (a) se inicie a aula destacando a importância da música como forma de expressão artística, (b) se introduza os conceitos de contradição e antonímia, bem como suas principais diferenças e destaque-se a importância delas no uso poético da música para criar o impacto no ouvinte e (c) se destaque o contexto do compositor Caetano Veloso e a importância das suas letras, como o que ele tenta trazer ou expor nelas; (2) uma etapa de audição na qual a música trabalhada seja reproduzida diante da turma e na qual se peça para que os alunos ouçam atentamente, para poderem relacionar os sentidos depois; (3) uma discussão inicial na qual (a) se inicie a discussão perguntando o que os alunos compreenderam a partir da música e como ela se relaciona com os tópicos contradição e antonímia, e (b) se peça exemplos de trechos da música que evidencie cada um desses conceitos.

Além dessas, convém ainda uma quarta etapa que consistirá na análise da música onde (a) seja disponibilizada a letra da música para a turma, (b) se divida a turma em grupos pequenos e peça para que façam a análise da música, destacando se há contradição e/ou antonímia nas estrofes da música, e, por último, uma quinta etapa, a qual consistirá numa atividade complementar na qual seja solicitado para que cada aluno escolha uma música de sua preferência e faça sua análise, destacando na letra os antônimos e contradições que ela possui. Além disso, seja solicitado ainda que, ao fim da análise, seja elaborado um breve comentário sobre a mensagem que o autor quis passar com a música.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por fim, ao examinar fenômenos semânticos, como contradição e antonímia, presentes na composição, destacamos a utilização de antônimos binários, inversos e gradativos. Esses elementos, habilmente empregados por Veloso, oferecem um contexto rico para o ensino da contradição, por isso, ela foi apresentada, sequencialmente, como exemplo de recurso didático para o ensino de tais conceitos, com foco no último dos três níveis da Educação Básica, o Ensino Médio.

Nesse sentido, fundamentamo-nos nos trabalhos de Márcia Cançado (2008), Fiorin (2003) e Noam Chomsky (1965) e concentramo-nos na análise da semântica, disciplina que explora os significados linguísticos por meio de manifestações linguísticas específicas presentes em sentenças e palavras. Nosso objeto de análise foi a música “O quereres” do cantor brasileiro Caetano Veloso. A letra da canção revela a complexa relação do eu-lírico com outro sujeito, destacando também suas próprias contradições.

Assim, a sequência de etapas pedagógicas proposta visa aprimorar a capacidade crítica, conhecimento de mundo e interpretação de texto dos alunos, além de promover a compreensão da poesia e da expressão artística na música popular brasileira. Ao utilizar a música como recurso didático, esperamos não apenas enriquecer o entendimento dos estudantes sobre a semântica, como também incentivá-los a explorar as complexidades da linguagem de forma criativa e reflexiva e propor um projeto de aula que instigue o engajamento dos alunos.

REFERÊNCIAS

CANÇADO, M. Manual de semântica: noções básicas e exercícios. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

FIORIN, J. L. Introdução à linguística: I. Objetos teóricos; II. Linguística: Estudo e Ensino. São Paulo: Editora Contexto, 2003.

VELOSO, C. O Quereres. Disponível em: https://www.letras.mus.br/caetano-veloso/44758/. Acesso em: 11 de set. 2023

CHOMSKY, N. A review of B.F. Skinner’s Verbal Behavior. Language 35 n. I, 1959.

– . Aspect.5 o(the TheO/y !!f’Syntax Cambridge: MIT Press, 1965.

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